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Alerta ao Congresso: BRICS e COP30 projetam o Brasil, mas os indígenas ainda clamam por água potável

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Por Ronaldo Medeiros (Foto:Marcello Casal/EBC) 05 de maio de 2025
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Brasília se prepara para sediar o 11º Fórum Parlamentar do BRICS, entre os dias 3 e 5 de junho de 2025. Serão três dias de solenidades, comissões temáticas e uma promessa recorrente: apresentar o Brasil como ator-chave no novo multilateralismo. Líderes parlamentares de 31 países devem desfilar pelo Congresso Nacional em defesa de uma “governança global sustentável”, em um evento que almeja protagonismo internacional. Mas, fora dos plenários climatizados, a realidade brasileira clama por atenção.

O Fórum poderia — e deveria — ser um palco para denunciar as contradições que corroem a credibilidade do país. Em vez disso, corre o risco de encenar mais um teatro diplomático: falas bem ensaiadas, imagens institucionalizadas e um documento final que ignora o essencial — o Brasil real, desigual e invisibilizado.

Enquanto Brasília finge ser capital da inclusão e da sustentabilidade, o sudoeste do Pará, no coração da Amazônia, vive uma tragédia silenciosa. Em uma decisão liminar proferida no final de abril de 2025, a Justiça Federal obrigou a União a fornecer água potável com urgência às comunidades indígenas de Itaituba, Jacareacanga e Trairão. Em pleno 2025, crianças e idosos ainda adoecem por consumir água contaminada por mercúrio, extraído de atividades ilegais toleradas por omissão estatal. A sentença impôs multas diárias e determinou envio regular de caminhões-pipa — uma medida extrema para conter uma crise básica: a falta de água.

O desmonte da saúde indígena na região é brutal. O orçamento do DSEI Tapajós, responsável pelo atendimento local, despencou 87% entre 2014 e 2024. Não se trata de acaso, mas de um projeto de abandono. Um projeto que silencia vozes indígenas, expulsa comunidades e transforma a floresta em commodity, enquanto o discurso oficial prega desenvolvimento verde.

Esse mesmo Pará, mutilado pela seca, pela contaminação e pelo colapso ambiental, será palco da COP30 em novembro. Belém promete ser a “capital climática do planeta”. Mas que Amazônia será apresentada ao mundo? A das cúpulas refrigeradas e das promessas em inglês técnico? Ou a das aldeias esquecidas, onde água limpa virou artigo de luxo?

O Brasil deseja falar alto no palco internacional. Quer liderar a transição ecológica, influenciar debates globais e renovar o multilateralismo. Mas não se constrói autoridade moral em cima de omissões internas. Não há liderança sustentável sem justiça ambiental de verdade. Não há protagonismo legítimo quando a base — o povo — continua à margem.

A diplomacia começa dentro de casa. E o mundo, cada vez mais atento, saberá distinguir performance de compromisso. Se o Brasil quiser ser escutado, precisa, antes, ouvir os gritos que vêm da própria terra.