A medida, defendida pela OCDE, não traz prejuízo ao contribuinte, que ainda pode recorrer ao Judiciário para contestar a decisão
O governo federal encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei que restabelece o voto de qualidade em caso de empate nos julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O novo texto vai substituir a Medida Provisória 1.160/2023 editada no começo do ano e que tem por finalidade disciplinar a proclamação de resultado e ampliar o limite de alçada do contencioso administrativo fiscal de pequeno valor.
Em 2020, uma alteração nas regras retirou do governo a prerrogativa de dar o voto decisivo durante os julgamentos do Conselho. A mudança significa, efetivamente, que quando os votos dos conselheiros representantes do setor privado e público resultarem em empate, a decisão é, por padrão, favorável às empresas. Após o julgamento, o governo, por sua vez, não pode recorrer. A alteração da lei estava suspensa por força da medida provisória que, se não apreciada pelo Congresso Nacional, perderia validade ainda neste mês.
A proclamação do resultado favorável ao contribuinte no caso de empate de votos, no âmbito do Carf, provocou a reversão do entendimento do tribunal em grandes temas tributários. Considerando que o empate nos julgamentos passou a favorecer os contribuintes, estima-se que cerca de R$ 59 bilhões, por ano, deixarão de ser exigidos.
A medida, segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é essencial. “O fim do voto de qualidade foi uma anomalia, uma distopia”, afirmou. Ele enfatiza que as mudanças buscam a resolução de um quadro avaliado como “insustentável”. O prejuízo é agravado pelo fato de a União ficar impedida de questionar judicialmente decisões que lhe são desfavoráveis.
Carta da OCDE
Em abril, o ministro da Fazenda recebeu carta da direção da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontando a oportunidade de melhoria nas regras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão que julga disputas bilionárias entre empresas e o governo federal em relação a pagamento de impostos.
No comunicado, o órgão salientou que a prática brasileira não encontra precedentes em outras jurisdições ao redor do mundo, principalmente no que diz respeito ao grau de participação dos entes privados nas decisões.
O governo pede urgência na tramitação do projeto de lei. O despacho que oficializa o envio foi publicado no Diário Oficial da União.
Contencioso
O PL também prevê a inclusão de um artigo que dispõe sobre o contencioso administrativo fiscal de baixa complexidade cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere mil salários-mínimos. A ideia é que, a partir de agora, essas questões sejam resolvidas, em duas instâncias, nas delegacias de julgamento da Receita Federal, para dar agilidade e eficiência ao órgão nos processos de maior repercussão. Atualmente, há um passivo médio de cerca de 100 mil processos administrativos no Carf. A medida visa, também, reduzir o tempo do julgamento e assim, prestar um melhor serviço ao contribuinte.
Conformidade tributária
O projeto de lei também cria 'classificação de conformidade' para empresas e permite ao Fisco não aplicar penalidades para bons contribuintes. Segundo o texto do PL, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil poderá estabelecer classificação de contribuintes de acordo com o grau de conformidade tributária e aduaneira, com base em alguns critérios pré-definidos.
No âmbito do programa, graduadas de acordo com a classificação do contribuinte, o Fisco poderá até deixar de aplicar eventual penalidade administrativa. O bom pagador terá ainda prioridade de análise em processos administrativos, inclusive quanto a pedidos de restituição ou ressarcimento de créditos, além de atendimento preferencial em serviços presenciais e virtuais.
Conforme a justificativa do PL, “a atuação cooperativa entre administração tributária e contribuinte objetiva maiores níveis de cumprimento voluntário incentivado das obrigações tributárias, com ganhos de eficiência para o Estado e redução de ônus para o cidadão”.